Peripécia Coletiva

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quinta-feira, 26 de maio de 2011

Pessoa-Livro

Introdução de mim

A vida sempre passou por mim sem fazer barulho. Da inconstância desse silêncio forçado, fui traçando meus objetivos alheio aos conflitos que minhas sociedades apresentavam. Nos mundos que aqui existem, há pelo menos vinte e nove sociedades que, ao longo de mim, vão sentindo e ressentindo, simples e intransitivamente.

A normalidade é uma constância inútil no adulto pueril. Ser assim é lutar contra um sistema daqueles cuja maior virtude é o desequilíbrio. Assim me apaixonei por Michael K.

Quando li pela primeira vez a obra Vida e Época de Michael K. , tive a nítida sensação de ter encontrado conflitos sociais internos nas palavras de J.M Coetze. O curso de minha vida sempre percorreu águas despretensiosas, silenciosas e repletas. O livro assim também começa, com a naturalidade melódica da página que é virada, oferecendo ao leitor uma vivência sem mistérios, descobertas ou surpresas intencionais, assim como uma ambiência simples, na qual a família, representada pela figura materna, é a maior das metáforas de vida.

A normalidade que assume o controle da minha vida não me faz cego para as questões políticas que por aí, aqui, acolá estão. Eu consigo, mudo - ou quase- , criticar e abalar estruturas que só eu conheço. Michael K, no livro, faz uma sutil crítica e apresenta uma África do Sul que só ele poderia conhecer. Um país em guerras, mas que por seu olhar sempre há mais belas palavras a serem apresentadas do que esta. Assim eu caminho pela estrada de tijolos cinzas. Vendo sociedades desgastadas e enxergando um mundo o qual só olhos despreocupados conseguem perceber.

Ser atordoado é a virtude a ser alcançada. Michael K me ensinou que é possível ser ao mesmo tempo ingênuo e crítico, racional e sentimental. Eu apenas aprendi a percorrer minha África conflituosa sem ser atingido pela constância da vida. Não a desejo.

Dessa forma, antes que os Bombeiros pudessem me fazer normal, me tornei uma pessoa-livro, me tornei Daniel – Vida e Época de Michael K. Coetze, no meu mundo, está eternizado. Inconstante.

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